Volatilidade marca semestre | Altos e baixos da Bolsa, aumento da Selic e aceleração da inflação deram o tom nos seis primeiros meses de 2010; mesmo assim, indústria cresce e chega a R$ 1,8 trilhão
Edição 218
A volatilidade não impediu o crescimento do mercado brasileiro de gestão de recursos no primeiro semestre deste ano. Depois de um 2009 de alta acumulada de 82,6%, o Ibovespa recuou mais de 11% até o fim de junho de 2010. A taxa básica de juros, que sofreu cinco cortes no ano passado e chegou ao inédito patamar de 8,75% ao ano, voltou a subir nos primeiros seis meses deste ano e encerrou junho em 10,25%. No mercado internacional, a sensação de que o pior da crise financeira já tinha passado foi ameaçada por um estresse que começou na Grécia e acabou se espalhando por outros países da Europa.
“Foi um semestre movido pelos dados. Qualquer informação que surgia gerava um comportamente diferente do mercado”, constata Carlos Massaru Takahashi, presidente da BB DTVM, primeira colocada do Top Asset, com R$ 424,3 bilhões em ativos. Mesmo assim, o período foi de crescimento, com os ativos sob gestão das assets chegando a R$ 1,8 trilhão e avançando 4,18% em seis meses.
Para a BB DTVM em particular, foi um semestre bastante positivo, com expansão de mais de 11% em ativos geridos. “Terminamos o período com o maior market share de nossa história. Há cerca de um ano, estávamos praticamente empatados com o Itaú Unibanco, e a incorporação da Nossa Caixa é que assegurou a nossa liderança. Agora, conseguimos ampliar a distância”, afirma Takahashi. De fato, a edição do Top Asset referente ao primeiro semestre de 2009 mostra uma diferença de apenas R$ 7 bilhões entre a BB DTVM e o Itaú Unibanco. Nesta nova edição, que compila dados dos seis primeiros meses de 2010, a vantagem saltou para mais de R$ 100 bilhões. Em dezembro do ano passado, a diferença entre os dois primeiros colocados do Top Asset era de aproximadamente R$ 68 bilhões.
Takahashi comenta que a preservação de capital e a garantia de liquidez aos investimentos foram grandes preocupações no período de janeiro a junho deste ano. “A força da placa Banco do Brasil e a boa performance que temos obtido ajudaram a trazer mais recursos de empresas, institucionais, governos e varejo”, acredita. O presidente da BB DTVM acrescenta que existe um rigor muito grande com os mandatos, o que também contribui para a conquista de clientes.
Renda fixa – Takahashi lembra que foi possível capturar prêmios interessantes na renda fixa, seja em títulos do Tesouro como as NTN-Bs ou em papéis de crédito privado como Certificados de Depósito Bancário (CDBs). “Foi um semestre muito bom para a renda fixa. Prestamos muita atenção à curva de juros, e os CDBs ajudaram a equacionar a volatilidade”, aponta.
Paulo Corchaki, diretor de gestão de recursos do Itaú Unibanco, também destaca uma retomada dos CDBs. Ele explica que, com a volta de boa parte dos depósitos compulsórios retirados no auge da crise como forma de garantir liquidez às instituições financeiras, os bancos em geral se viram na necessidade de captar mais CDB. O executivo afirma que esse movimento acabou gerando uma competição momentânea entre os fundos de investimentos e os CDBs, que se tornaram mais interessantes no primeiro semestre. “Mas isso não deve ocorrer nos últimos seis meses de 2010”, estima. O Itaú Unibanco, em segundo lugar no Top Asset, encerrou junho com R$ 317,15 bilhões e crescimento de 1,02% em seis meses.
Denise Pavarina, superintendente da Bram – Bradesco Asset Management, comenta que a inflação acima do esperado contribuiu muito para o cenário volátil que marcou o primeiro semestre de 2009. “Havia também uma incerteza em relação ao movimento do Banco Central com relação aos juros”, completa. A Bram ficou em quarto lugar no Top Asset, com R$ 215,6 bilhões sob gestão ao final de junho e incremento de 6,22% em seis meses. A gestora do Bradesco ficou logo após a Caixa Econômica Federal, que por sua vez fechou o primeiro semestre do ano com R$ 226,02 bilhões em ativos e crescimento de 6,41%. Em quinto lugar no levantamento está o Santander, com R$ 104,94 bilhões sob gestão ao fim do período de janeiro a junho de 2010. A expansão alcançada pela asset em seis meses foi de 6,63%.
Renda variável – Os rescaldos da crise financeira internacional e os problemas deflagrados na Europa trouxeram bastante oscilação à Bolsa nos primeiros seis meses do ano. Para se ter uma ideia, o Ibovespa caiu 4,6% em janeiro de 2010, subiu 1,6% em fevereiro e 5,8% em março, voltou a cair 4% em abril, recuou 6,6% em maio e teve nova queda de 3,3% em junho. A estratégia do Itaú Unibanco, nesse caso, foi olhar para ações de setores voltados para a economia interna. “Pegando a renda variável especificamente, determinados setores foram muito bem e outros muito mal. Neste ano, a boa seleção de setores e empresas fez muita diferença”, avalia Paulo Corchaki. Nessa linha, a principal aposta da asset foi nos segmentos de consumo interno e infraestrutura. “Estávamos mais reticentes em relação aos setores mais dependentes de vendas externas, como o de commodities”, detalha.
Apesar da volatilidade, o investidor está mais tranquilo em relação ao sobe-e-desce da Bolsa e não tem se mostrado tão assustado. Essa é a percepção de Takahashi, da BB DTVM. “Mesmo com o mercado andando de lado, o investidor está mais estável. Não se vê mais aquela fuga em manada. Os investidores estão amadurecendo gradualmente”, observa. Ele completa que o portfólio de renda variável da BB DTVM é bastante diversificado, com fundos de small caps, dividendos e setoriais dos mais diversos segmentos. “A entrada de recursos é lenta e constante, e a saída é marginal”, resume o executivo.
Marcelo Mello, vice-presidente da SulAmérica Investimentos, também sente uma certa mudança no comportamento dos investidores, nesse caso especificamente dos institucionais. Ele conta que a tendência de queda da taxa de juros já motiva os fundos de pensão a olharem os produtos de maior valor agregado da casa. “Essa é uma necessidade que existe e as entidades continuam procurando novos instrumentos”, comemora o executivo, ao abrir que a maioria dos institucionais da sua carteira tem optado por fundos exclusivos. A SulAmérica ficou em terceiro lugar no segmento de assets independentes do Top Atuarial, com R$ 16,26 bilhões em ativos ao final de junho e avanço de 22,68% em seis meses. A categoria é liderada pela BNY Mellon ARX Investimentos (R$ 31,52 bilhões e crescimento de 5,91%), seguida pela Western Asset Management (R$ 24,59 bilhões e expansão de 10,46%).
Para Mello, o resultado alcançado pela SulAmérica Investimentos reflete um intenso trabalho da asset sempre focado no mercado institucional.
“Além da própria natureza do grupo de atuar diretamente com fundos de pensão, também estamos oferecendo um portfólio bastante competitivo, o que tem contribuído para agregar muito para o investidor”, analisa. Ele resume que a gestora tem calcado sua estratégia em três pilares principais: gestão da rentabilidade, relacionamento direto com o mercado e uma grade de produtos competitivos.
Ontem e amanhã – Para Denise Pavarina, da Bram, a primeira metade do ano foi marcada por decisões de investimento pontuais. “Nesse semestre, foi mais difícil tomar um posicionamento direcional. As posições foram pontuais, em função de incertezas tanto em relação aos juros quanto à Bolsa”, comenta. Marzo Bernardino, diretor executivo da Western Asset, opina que a maior dificuldade nos primeiros seis meses do ano foi identificar oportunidades claras de investimento. “No período, não houve uma classe de ativos que o mercado olhou e identificou como extremamente barata, em que houvesse certeza de ganho e captura de um retorno adicional. Em grande parte das apostas de ações e renda fixa, o mercado não tinha uma visão clara ou consensual”, reforça. O executivo acredita que o segundo semestre deve continuar mostrando essas dificuldades.
Segundo Bernardino, o fluxo grande de recursos de estrangeiros para o mercado de renda fixa pode colocar alguma pressão sobre a curva futura de juros. “Além disso, os players domésticos têm ainda alguma dúvida sobre como será a atuação do Banco Central nesse segundo semestre”. As principais dúvidas, para ele, são em relação a como a política monetária empregada irá afetar a expectativa de inflação futura e a atividade econômica. “ Há algumas situações que devem tornar o período difícil para grandes apostas”, estima.
Denise Pavarina, da Bram, também vê volatilidade para os últimos seis meses do ano. “É um período de eleições e ainda há o fator externo”, diz.
Segundo ela, ainda que o Bram não veja risco no período eleitoral, essa é sempre uma época de maior indefinição, com diversas notícias circulando.
“No exterior, é preciso ver o comportamento dos Estados Unidos. Os números não são tão bons como vinham sendo e há muita incerteza em relação à economia internacional”, indica. Para a executiva, a inflação já parece mais controlada. “No entanto, a tendência ainda é procurada de maneira mais clara, o que deve levar a posições menos direcionais e mais pontuais”, prevê.
Paulo Corchaki, do Itaú Unibanco, lembra que em 2008 houve a crise, o que fez dele um ano muito ruim, e em 2009 veio a recuperação, o que fez dele um ano muito bom. Já 2010 é um ano de muita volatilidade. Ele pondera, no entanto, que as notícias ruins já estão embutidas, depois de seis meses com a economia mundial andando de lado. “Qualquer notícia um pouco melhor já será boa”, diz Corchaki.
Para Takahashi, da BB DTVM, este deve ser um bom semestre para a indústria de gestão de recursos. Ele lembra que, no que se refere especificamente à previdência aberta, o final do ano é uma fase de alta da captação por conta dos benefícios ao Imposto de Renda. “Esse é um segmento que está crescendo muito, e o segundo semestre é uma época bastante positiva para a venda desses produtos”, afirma. O executivo acredita que a Bolsa deve experimentar um movimento de alta até o final do exercício e que as eleições não chegam a ameaçar o andamento da economia. “Estamos em uma situação muito mais estável. O processo eleitoral deve correr sem nenhum movimento de aversão a risco. Mesmo porque, não acredito que haja um risco político embutido à ordem econômica do País”, reforça.
Sobre o futuro, esperança de Takahashi é que o dinheiro dos brasileiros migre do consumo para a poupança de longo prazo. “É certo que há uma demanda reprimida e, quando as pessoas começam a melhorar de renda, a primeira coisa que elas fazem é comprar o que estava faltando. Mas quando elas começam a fazer planos de mais longo prazo, como por exemplo a compra de um imóvel, surge a necessidade de um planejamento financeiro. Isso deve gerar processo de transferência de recursos do consumo para a indústria de investimentos”, prevê o executivo.
Esta edição do ranking Top Asset contou com a participação de 143 gestoras de recursos, que responderam a um questionário enviado a elas por Investidor Institucional.